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Crianças e telas: muito além do sim x não

Crianças e telas: uma conversa necessária e um tanto complexa, ainda mais no período que vivemos. Se até o ano passado a discussão girava em torno dos protocolos recomendados pelas associações de pediatria no mundo sobre esse assunto, a pandemia veio para chacoalhar tudo: entre a recomendação e a realidade dos lares que também viraram escola e lazer, tudo isso enquanto os pais e cuidadores – principalmente mulheres – tentam equilibrar outros inúmeros pratinhos, como podemos pensar em uma relação mais saudável das crianças com o digital?

E, mesmo quando falamos dessas recomendações, o quanto elas são, realmente aplicáveis nos dias de hoje? Os benefícios e facilidades proporcionados pela tecnologia são incontestáveis. Porém, é essencial lembrarmos que, o uso exagerado, inadequado e prematuro dessas ferramentas pode ser responsável por danos no desenvolvimento infantil, levando a problemas emocionais, físicos e até mentais. 

Por isso acho importante aprofundar um pouco a discussão sobre telas, ir além do debate reducionista do “telas sim x telas não”. Afinal, como tudo na maternidade e na vida, acho importante encontrar o caminho do meio. 

Então, no post de hoje, não quero trazer respostas prontas, porque acredito que elas não existem e depende muito da realidade de cada família, mas quero trazer algumas reflexões unindo a ciência e a vida real da maternidade, para ajudar a orientar as crianças no que diz respeito a bons hábitos tecnológicos, para que eles possam usufruir das tecnologias digitais de forma segura, crítica, responsável e ética.

Por que não? 

Uma busca simples no Google sobre crianças e telas vai te apresentar inúmeros conteúdos rechaçando o uso de telas na infância. E isso tem um motivo, é claro. São inúmeros estudos – que embasaram recomendações de sociedades de pediatria no mundo todo sobre limites e recomendações para uso de telas – que falam sobre os malefícios que a tecnologia pode causar a crianças e adolescentes.

De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria, os principais malefícios associados ao uso precoce, exagerado e inadequado das telas incluem:

  • Problemas de saúde mental: irritabilidade, ansiedade e depressão;
  • Transtornos do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH);
  • Transtornos do sono;
  • Transtornos de alimentação: sobrepeso/obesidade e anorexia/bulimia;
  • Sedentarismo e falta da prática de exercícios;
  • Bullying e cyberbullying;
  • Transtornos da imagem corporal e da autoestima;
  • Riscos da sexualidade, nudez, sexting, sextorsão, abuso sexual, estupro virtual;
  • Comportamentos autolesivos, indução e riscos de suicídio;
  • Aumento da violência, abusos e fatalidades;
  • Problemas visuais, miopia e síndrome visual do computador;
  • Problemas auditivos e perda auditiva induzida pelo ruído;
  • Transtornos posturais e músculo-esqueléticos;
  • Uso de nicotina, vaping, bebidas alcoólicas, maconha, anabolizantes e outras drogas.

São muitos e essa lista assusta. Eu sei. Mas perceba que esses prejuízos dizem respeito ao uso precoce, exagerado e inadequado. O que isso quer dizer? 

Uso precoce é o uso antes da idade recomendada e o uso excessivo seria passar tempo demais em frente às telas, substituindo atividades e vivências importantes para o desenvolvimento, saúde e bem estar da criança e do adolescente. Já o uso inadequado diz respeito a fazer uso de eletrônicos em locais ou horários não recomendados ou, ainda, acessar conteúdos nocivos ou impróprios.

Mas não é só de malefícios que a tecnologia é feita. Vivenciamos na força durante a pandemia a possibilidade de manter aulas, de trabalhar, de ter contato por vídeo com familiares e pessoas queridas utilizando somente um celular, graças à tecnologia. Fora outras facilidades como transações bancárias sem precisar enfrentar a fila de um banco, telemedicina, a possibilidade de praticar atividade física, meditar, aprender outro idioma, se deslocar para qualquer lugar sem precisar de um mapa de papel. A lista de benefícios é, também, extensa! 

Ou seja, a tecnologia não vai a lugar algum e nós precisamos aprender e ensinar nossos filhos a lidar bem com ela. Não é porque as crianças dessa geração já nascem sabendo usar um smartphone que eles tem a maturidade necessária para entender conceitos como privacidade, limites, conteúdos inadequados, segurança, fake news, etc. Eles precisam da nossa mentoria. 

E como guiar nossos filhos para um uso saudável das telas? 

crianças e telas

A Sociedade Brasileira de Pediatria publicou um manual com as seguintes recomendações sobre o uso de telas: 

•  Evitar a exposição de crianças menores de  2 anos às telas, sem necessidade (nem passivamente!) 

•  Crianças com idades entre 2 e 5 anos, limitar o tempo de telas ao máximo de 1 hora/dia, sempre com supervisão de pais/cuidadores/ responsáveis. 

•  Crianças com idades entre 6 e 10 anos, limitar o tempo de telas ao máximo de 1-2 horas/dia, sempre com  supervisão  de  pais/responsáveis. 

•  Adolescentes com idades entre 11 e 18 anos, limitar o tempo de telas e jogos de  videogames  a 2-3 horas/dia, e nunca deixar “virar a noite” jogando. 

•  Não permitir que as crianças e adolescentes fiquem isolados nos quartos com televisão, computador,  tablet, celular,  smartphones  ou com uso de  webcam; estimular o uso nos locais comuns da casa. 

•  Para todas as idades: nada de telas durante as refeições e desconectar 1-2 horas antes de dormir. 

Para momentos em que você a tela for liberada, o livro “Tela com Cautela” sugere a elaboração de um plano de uso de eletrônicos, que reflete a realidade de cada família, levando em consideração a dinâmica familiar. Para elaborar esse plano, você deve considerar 5 passos:

  1. Quanto tempo a criança terá acesso ao eletrônico 
  2. Qual o conteúdo ela tem permissão de acessar 
  3. Em que locais os eletrônicos poderão ser utilizados
  4. Em que momentos do dia seus filhos terão acesso às telas 
  5. De que forma os eletrônicos devem ser utilizados 

Cada um desses passos será respondido de acordo com a sua necessidade e realidade e pode ser modificado sempre que houver necessidade. 

Para os momentos em que o uso de eletrônicos não está liberado, é importante criar oportunidades para que nossos filhos possam viver uma infância que inclua brincar, socializar, estar ao ar livre e em contato com a natureza, ler e ter tempo para fazer nada, para viver o tédio. 

Aqui no De Mãe em Mãe temos alguns conteúdos sobre a importância do ócio para o desenvolvimento das crianças e também de algumas brincadeiras para fazer em casa com as crianças, que podem te ajudar nessa jornada. 

Além disso, uma boa alternativa, é criar o pote do tédio para aquele momento em que seu filho diz “mas não tem nada para fazer!”. O pote do tédio é um vidro ou caixa em que você vai colocar vários bilhetinhos dentro com atividades que não envolvam eletrônicos, como brincar com o cachorro, fazer um pic nic no quintal, montar um quebra cabeça, ler um livro, escrever ou desenhar seu próprio livro… são infinitas possibilidades. 

É importante entender que a nossa própria relação com a tecnologia também influencia os hábitos dos nossos filhos. Então a nossa própria dependência da tecnologia precisa ser revista na hora de impor esses limites aos nossos filhos. 

Entender também que tudo é questão de hábito e hábitos não se formam e nem se quebram do dia para a noite. Viemos de uma realidade em que, para a maioria das famílias, a única alternativa era tela. A escola era tela, a única alternativa de lazer era tela – eu moro em casa e tenho quintal, mas a realidade da maioria das famílias durante a pandemia foi ficar dentro de um apartamento e ninguém tem culpa disso. 

Então é possível que essa adaptação de redução de tempo de tela seja difícil no começo, mas com o  tempo as crianças descobrem novos passatempos e hobbies. Leva tempo, incentivo e paciência mas vale a pena no final. 

Como está sendo a relação entre crianças e telas perto de vocês? Lembrando que aqui é um espaço de não julgamento e sim de aprendermos juntas! 

De mãe em mãe, construiremos um novo maternar!

Referências

COUNCIL ON COMMUNICATIONS AND MEDIA. Media and Young Minds. Pediatrics. 2016;138(5):e20162591. doi:10.1542/peds.2016-2591

Sociedade Brasileira de Pediatria. Manual de Orientação #menos telas #mais saúde. Publicado em dezembro de 2019. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/_22246c-ManOrient_-__MenosTelas__MaisSaude.pdf. Acessado em: janeiro de 2021. 

Rafaela Carvalho. Roberta Ferec. Tela com cautela – um guia prático para criar filhos na era digital sem perder a sanidade. Curitiba: Editora Matrescência. 2019. 

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